quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Desmundo - Relação entre o filme e os textos lidos durante o primeiro semestre do curso de História do Brasil


O filme Desmundo conta a história de Oribela, uma jovem órfã vinda de Portugal ao Brasil recém-descoberto, por volta de 1570. Chegando à América Portuguesa, Oribela enfrenta várias situações e passa por diversos problemas, que apesar do caráter fictício da obra, suas desventuras podem ser comprovadas historicamente através dos vários textos que tivemos a oportunidade de ler nesse primeiro semestre do curso de História do Brasil I. Apresentaremos uma relação entre filme e textos, separando-os tematicamente de acordo com o nome dos trabalhos lidos.

Mulheres Educadas na Colônia

Neste texto, Arilda Ribeiro nos faz um apanhado geral da situação feminina no Brasil Colônia, e pela temática do filme, é um dos textos que mais podemos recordar ao assisti-lo.

Logo nas primeiras cenas do filme, podemos ouvir a narração de uma carta do padre endereçada à Metrópole, na qual fala da falta das mulheres nas terras do Brasil, e pede ao Rei de Portugal que enviem quaisquer mulheres, para poder apartar os homens do pecado. Isso pode ser comprovado historicamente pelas palavras da autora, que diz que “com o aumento da população de mestiços (...), os jesuítas e a metrópole preocuparam-se em importar para o Brasil levas de mulheres brancas com o intuito de reprodução e fixação do padrão étnico europeu / branco”, e ainda destaca que não tinha “importância se na metrópole fossem órfãs, ladras, prostitutas, alcoólatras, mentalmente incapacitadas”, pois o importante era a “perpetuação do domínio europeu”.

Logo após a chegada, as meninas são levadas a banhar-se e duas delas conversam sobre a falta de mulheres na colônia, e sobre a impossibilidade de ter filhos nas terras brasileiras por conta disso. Uma delas, a mais nova, afirma então que os homens podiam parir seus os filhos pelo sovaco, se essa fosse à vontade de Deus. Isso demonstra que, além de não receber educação escolar de nenhum tipo, “as mulheres brancas, na sua maioria, também eram sexualmente ignorantes”.

Mais adiante, há uma cena de casamento entre os colonos aqui estabelecidos, e as órfãs recém-chegadas. Uma das coisas que podemos comprovar logo de cara é a diferença de idade das meninas e desses colonos, pois “a mulher branca colonial (...) casava-se muito cedo” já que “com 11 ou 12 anos, as meninas estavam prontas para o casamento com homens de 40 ou 50 anos”. O casamento então era um acordo e visava unicamente à reprodução, não havendo nenhum tipo de “laços afetivos, mas sim contratos econômicos”.

Oribela e Francisco de Albuquerque se casam, e não se conhecem. Mal chegando a casa, Francisco toma Oribela sem cerimônia, para realizar um ato sexual simplesmente porque ele é “seu marido”. Mais adiante, Francisco violenta e estupra Oribela por haver encostado seu dedo no dedo do comerciante Ximeno Dias, mostrando seu ciúme e seu direito de marido de mandar na sua esposa. Sobre esse tema, a autora nos diz que “as relações sexuais entre os portugueses, muitas vezes, eram verdadeiros estupros”, pois visavam única e exclusivamente a “reprodução dos filhos de Deus”, e o único que poderia disfrutar de algum prazer sexual era o senhor patriarcal, e esse prazer na maioria das vezes ficava a cargo das “escravas que, além de servi-lo nas tarefas da casa, deveriam satisfazê-lo na cama”. Isso nos é mostrado, muito que superficialmente no filme, quando dois portugueses que atendem à cerimônia de casamento conversam entre si, e um diz que “mais gosta das selvagens”.

Por volta dos trinta e oito minutos de filme, Oribela tenta fugir de Francisco após o estupro. Consegue chegar à praia e implora que a levem de volta ao Reino, e quase que acaba sendo estuprada de novo, até que Francisco a encontra e a carrega de volta à sua casa. Anteriormente, antes mesmo de se casar, Oribela já havia implorado que lhe enviassem a um convento. Isso nos mostra como os conventos eram verdadeiros asilos para as mulheres que rechaçavam o casamento com os colonos, e como elas “eram internadas sem nenhuma vocação definida, e com pouca idade”.

O Semeador e o Ladrilhador

Neste texto de Sérgio Buarque de Holanda, é feita uma análise das diferenças entre a colonização portuguesa e espanhola na América, com especial ênfase aos erros cometidos pelos primeiros no processo de colonizar seus domínios americanos. Apesar do filme se passar logo no início desse processo, podemos ver alguns desses equívocos portugueses, que cuidaram “menos em construir, planejar ou plantar alicerces, do que em feitorizar uma riqueza fácil e quase ao alcance da mão”, já que “a colônia é simples lugar de passagem”.

Em vários momentos do filme, em especial nas tomadas vistas de cima, vemos casas dispostas de forma aleatória, sem nenhum planejamento. Um exemplo bem claro no filme é quando, por volta de uma hora e sete minutos, Oribela chega a vila aonde mora Ximeno Dias. Aqui fica bem claro o caráter desordenado das construções portuguesas e da falta de planejamento e infraestrutura. Sérgio Buarque aponta que na Bahia, “o maior centro urbano da colônia, um viajante do princípio do século XVIII notava que as casas se achavam dispostas segundo o capricho dos moradores. Tudo ali era irregular, de modo que a praça principal, onde se erguia o Palácio dos Vice-Reis, parecia estar só por acaso no seu lugar”.

No caso da colonização espanhola, os castelhanos foram mais ordenados, buscavam a “criação de núcleos de povoação estáveis e bem ordenados”. Havia um planejamento para que as ruas tivessem o “acento voluntário da linha reta”, enquanto que o “traçado geométrico jamais pôde alcançar, entre nós, a importância que veio a ter em terras da Coroa de Castela”. Outro inconveniente a ser superado pelos espanhóis era do clima, já que estes procuravam lugares nos quais o clima não oferecesse, “em geral, grandes incômodos”. No caso português, dado ao caráter passageiro de sua estada aqui, pouco importava buscar um clima que fosse semelhante ao europeu. Podemos comprovar isso no filme quando ouvimos que “dona Oribela anda mal pela temperatura”, ou ainda quando Ximenes Dias reclama da umidade de nossas terras, que arruínam seu juízo.

Outra preocupação castelhana, era a de concentrar seus grandes centros longe das regiões litorâneas, “preferindo as terras do interior e os planaltos”. Já aos portugueses, “não importava muito aos colonizadores povoar e conhecer mais do que as terras da marinha, por onde a comunicação com o Reino fosse mais fácil”. Vemos esse apego português ao litoral aos vinte e um minutos do filme, quando Oribela, logo após seu casamento, segue a caminho da casa de Francisco de Albuquerque e reclama que já não consegue mais ver o mar. Esse caráter marítimo de colonização seguiu por todo o período de dominação portuguesa.

Ouvir, ver, ouvir dizer: relatos franceses sobre o Brasil

Neste texto de Lília M. Schwarez, a autora descreve os diversos relatos de franceses que estiveram presentes, ainda que clandestinamente, nas terras brasileiras, e com seus relatos sobre o que viam aqui enfureciam a Coroa portuguesa, dada a sua política do sigilo, de descobrir terras e procurar, ao máximo, não divulgar nem seus descobrimentos, tampouco o que havia sido descoberto. Muitos desses relatos envolvem, sobretudo, os conflitos e diferenças culturais entre os europeus e os indígenas, em especial a extinta tribo dos Tupinambá, e seus inimigos, os Tupi-guarani.

Apesar de não vermos nenhum francês ao longo do filme, sua presença nos domínios portugueses pode ser comprovada quando, por volta dos dez minutos, há um embate entre os brancos e os Tupinambá, que haviam aprisionado alguns europeus que pretendiam controlar e cristianizar os índios, sendo que os últimos preferiam seguir com suas tradições. O chefe dos portugueses pede para ver os prisioneiros levados pelos índios, e promete devolvê-los caso sejam franceses.

Durante a cerimônia de casamento, o padre faz um sermão no qual prega para que os noivos não vivam como os “negros da terra”, em pecado constante. Isso porque para os portugueses, os nativos viviam “sem fé alguma” o que conformaria uma “anti-humanidade”. Schwarez ainda cita a teoria do povo sem fé, lei e rei, pela ausência dos fonemas F, L e R na língua dos índios brasileiros e como a “falta de fé, práticas de canibalismo e da poligamia serviam para iluminar a certeza da ausência de regras entre esses povos”. Um momento interessante do filme é quando uma índia fala em sua língua nativa com Oribela e chama Francisco de “Pancisco”.

Sobre o canibalismo, há uma cena na qual Ximeno Dias mostra seu descontentamento sobre o comércio, em especial a troca de escravos, com os índios, reclamando que “não anda fácil tratar com eles (os índios)”, pois “querem comê-los, não vendê-los”.

Sentido da Colonização

Aqui, Caio Prado Júnior faz uma análise dos fatores que levaram à expansão e definição das fronteiras brasileiras. Um dos principais fatores apontados pelo o autor é a pecuária de subsistência, a qual “se deve a ocupação de boa parte do território da colônia”, e que apesar de pouco presente no filme, pode ser vista na conversa de Francisco de Albuquerque e sua mãe, quando esta lhe pergunta sobre o dote do casamento e ele responde que consiste em “dos vacas”. Por conta disso, Francisco aparece durante a maior parte do filme usando um colete, botas e cinto de couro.

Formas provisórias de existência

Dado ao caráter passageiro da estada dos colonos no Brasil, e a precariedade geral das condições da colônia devido à falta de planejamento e infraestrutura da Metrópole, os portugueses e seus descendentes criaram formas originais de adaptação, o que acarretou em uma série de hábitos gerados da mescla da cultura europeia com a cultura indígena. A autora Laura de Mello e Souza nos aponta alguns dos “hábitos cotidianos desenvolvidos pelos sertanistas de Piratininga” que “num primeiro momento, distanciam-se dos trazidos da mãe-pátria europeia, e adotam os próprios às populações indígenas da região” e “em seguida, começam a desenvolver hábitos compósitos”.

Um desses hábitos é a preferência de Francisco por dormir em redes, “a cama mais pronta e mais portátil que havia”. A mescla com a cultura indígena se pode ver em uma cena na qual uma índia remove folhas dos pés de Oribela, que haviam sido machucados pela caminhada a pés descalços desde a praia, demostrando o uso indígena das plantas medicinais a ser incorporado pelos sertanistas, pois “quando os entrantes adoeciam, o próprio meio natural lhes fornecia o remédio”.

Escravidão negra em debate

Suely Robles Reis de Queiróz faz aqui uma análise dos diversos estudos e visões sobre a questão escravista no Brasil, desde Gilberto Freyre que salientava a “doçura nas relações de senhores com escravos domésticos”, até autores que apontavam que havia “castigos diários rotineiros”, até outros que afirmam que existia, em realidade, uma atitude de “acomodação e ajustamento”.

Com exceção do escravo de Ximeno Dias, não vemos nenhum escravo negro no filme, apenas escravos indígenas. Porém, podemos traçar um paralelo com o comportamento de Oribela ao longo do filme, que procura ter uma maior mobilidade dentro de seu ambiente, e assim amenizar os castigos que poderia vir a sofrer. Um exemplo é como Oribela se oferece sexualmente para Francisco, como perdão por sua fuga e medo de voltar a ser acorrentada. A tática funciona, pois após esta cena, Oribela ganha um baú com roupas, além de ganhar também a permissão para andar pela propriedade de Francisco.

2 comentários:

  1. MUITO BOM PARABÉNS QUAL FACULDADE VOCE FAZ ?

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